quinta-feira, fevereiro 21, 2008
No post aí embaixo, eu falei que voltei a fazer jornada dulpa de trabalho. Não que eu tivesse deixado de fazer, só que a segundo turno deixou de ser na minha casa.
Eu trabalho durante o dia em uma grande editora. À noite, presto serviço pra um bureau, que presta serviço pra grandes editoras e - o mais importante - paga bem.
Como eu não tenho Mac em casa, só PC, e o bonito exige que os trabalhos sejam feitos em Mac, no começo, eu saía da editora umas 18h, corria pro bureau e ficava lá até umas 22h30. De uns três meses pra cá, o dono do bureau arrumou um Mac Mini pra deixar na minha casa. Assim eu trabalhava em casa com o computador dele.
Há uns dez dias, a máquina que ele usa no escritório quebrou. Como eu estava sem serviço, ele pegou a que estava aqui na minha casa. Eu já havia decidido comprar um Mac pra mim. Comecei a escolher qual seria o modelo e fazer pesquisa de preço. Apareceu uma oportunidade ótima de comprar um avião com um descontaço. Eu não gosto de fazer compras parceladas, e agora não tenho o dinheiro pra pagar de uma vez e me livrar de dívida. Maaaaaas, na próxima sexta-feira, eu recebo o pagamento de um trabalho no valor exatinho do avião. Sinal divino, hein. Tudo resolvido. Espero a próxima semana, recebo, compro a máquina e trabalho tranqüila em casa. Fantástico!
Enquanto isso, na sala de justiça, entrou trabalho pra mim e eu voltei a sair correndo feito uma louca da editora pra ir pro outro turno. Hoje não foi diferente. Aliás, foi um pouco. Eu saí correndo muito mais rápido porque o céu estava preto, avisando que ia desabar um temporal.
Pra chegar no bureau, desço no metrô Anahangabaú e ando uns vinte minutos, sendo os últimos cinco de subida. Fui quase correndo, esbaforida com medo da chuva que eu tava segurando com a força do meu pensamento, até chegar no prédio. Mas é por pouco tempo. Faltam só oito dias pra eu receber e ter meu computadorzinho de maçã preta aqui na minha frente. A vida vai ser muito melhor e eu não vou me incomodar com detalhes. Certo?
Cheguei (viva, quase que por milagre) e toquei o interfone. Nada. Estranho. Toquei de novo. Nada. Um morador chegou, abriu a porta do prédio e eu aproveitei pra entrar. Toquei a campainha. Nada. Meu sangue começou a subir. Telefonei. Nada. Comecei a tremer. Liguei na casa do infeliz. Atendeu alguém que me disse que o bonito tinha acabado de sair pra fazer companhia pra um amiogo que ia comprar um carro.
Então, eu avisei que estava na porta do escritório e que não havia ninguém lá dentro, porque quem deveria estar lá dentro estava comprando carro com um amigo. "Gente!". "Pois é". Me pediram dois minutos pra se comunicarem com o infeliz. Dois minutos depois, recebi a notícia que o bonito estava preso em um mega congestionamento e não conseguiria chegar lá. Eu estava dispensada.
Não sabia se queria morrer ou matar de ódio. Na dúvida, resolvi achar um jeito de sair do prédio, já que este não tem porteiro e a porta só pode ser aberta de dentro de um dos apartamentos. Ouvi vozes no outro andar. Desci. Havia uma senhorinha saindo com um cachorro. Eu pedi pra ela abrir a porta pra mim. Acho que ela pensou que eu era louca, mas abriu.
Estava no começo dos vinte minutos de caminhada de volta ao metrô quando começou a chover torrencialmente. Pois é, eu desviei a força do meu pensamento pra invenção de novos xingamentos e palavrões e não consegui mais segurar a chuva.
Estava num passo tranqüilo, e num passo tranqüilo permaneci. Pensei que tudo isso estava acontecendo só porque eu não tenho uma porra de um Mac. Ou talvez por uma falta de respeito sem tamanho. A primeira opção era mais proveitosa no momento.
Poucos metros antes do metrô, percebi que tinha alguma coisa de muito errada, além do fato de eu estar ensopada. Tava uma muvucada na porta, um bando de gente, uma coisa anormal até pra um dia de chuva. Eis que eu descobri que virou moda as pessoas tentarem se matar pulando no trilho do metrô no horário de pico. Pela segunda vez na semana, isso estava acontecendo. Os trens estavam parados e as pessoas continuavam a entrar na estação. Eu juro que tive vontade de entrar só pra ver se, diferente do caso anterior, o filho da puta tinha morrido. Caso não tivesse, teria o maior prazer em ajudá-lo. Mas era humanamente impossível entrar naquela estação, mesmo por uma causa tão nobre.
Eu moro a quatro estações dali (não faço idéia de quanto isso dá em medida de gente grande, mas é longinho. Lonjinho? Enfim...). Como eu já tava ensopada mesmo, resolvi ir a pé. Só que eu tinha um problema: minha bolsa é de pano. Se ela tomasse mais quatro estações de chuva, tudo que tinha lá dentro ficaria imprestável. E eu tenho coisas importantes dentro da bolsa, apesar de alguns não acreditarem.
Parei numa banca de jornal, onde algumas pessoas se abrigavam da chuva enquanto torciam pro filho da puta ter virado um patê bem homogêneo nos trilhos do metrô, olhei pro dono com cara de cachorro molhado e pedi uma sacolinha plástica. Ele me olhou como se eu fosse insana, mas achou uma sacola. Eu pus tudo que tinha dentro da bolsa, sob os olhares curiosos de toda a torcida do patê, dei um nó, pus dentro da bolsa e fui andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Andando. Durante todo o percurso, dividi meu pensamento entre criar xingamentos e impropérios, pesar a falta do Mac com a falta de respeito.
Cheguei na Tiradentes e resolvi entrar no metrô Luz pra ver se já tinham posto o patê num potinho. Se não tivessem, eu faria o que qualquer pessoa adulta e equilibrada faria depois de uma experiência dessa: sentar e chorar. Felizmente, já tinham empacotado o patê. Peguei o metrô. Desci duas estações depois. Já não chovia. Cheguei em casa, tomei banho, pedi esfirras e comi-las. Agora estou me sentindo um pouco quente.
Amanhã eu vou comprar meu Mac em três vezes sem juros.